5.01.2015

Eva Klabin, Colecionismo e Singularidade.

Eva Klabin (1903 - 1991) criou no Rio de Janeiro uma fundação para conservar, pesquisar e expor ao público sua coleção.
Na Av. Epitácio Pessoa, 2480 na Lagoa encontra-se a Fundação Eva Klabin (FEK), fundação esta que reune um dos maiores acervos de arte clássica do país. A fundação leva o nome de sua genitora que foi uma conhecida agitadora cultural e colecionadora de artes do Rio de Janeiro. Filha de um dos fundadores da empresa que é atualmente a maior recicladora de papéis da América do Sul, a Klabin S.A. Empresa que em 2014 obteve o lucro de aproximados R$ 730 milhões.  
A fundação foi criada um ano antes da morte de sua criadora que morreu em 1991, ao longo da vida Eva Klabin se dedicou a obter itens para sua coleção. Hoje é tida como referência na história do colecionismo do Brasil. A casa que abrigou Eva durante grande parte de sua vida é aberta a visitação, onde é exposto grande parte de sua coleção.
Conhecer a fundação é uma experiência fantástica, desde a entrada até o final do circuito os olhos são preenchidos com objetos dos mais diversos períodos históricos. É possível uma viajem através da história por meio dos objetos materiais ali expostos, sendo esta uma coleção que abarca diversos período da história. O curioso é imaginar que alguém dedicou sua vida a essa missão de juntar peças valiosas e então morar conjuntamente com esses objetos. Podemos imaginar como deveria ser gratificante para a viúva Klabin perambular por entre os cômodos tendo uma parte da história da arte desvelada sobre si.
Dentre os diversos ambientes o que mais me chamou atenção foi o Quarto de Dormir. Sendo um espaço aparentemente modesto, porém ao meu ver foi capaz de revelar algo único, que poderia passar despercebido em outros ambientes. Dentre tantos objetos havia alguém! e essa figura pode ser resgatada com maiores detalhes em seu quarto. Talvez Eva seja uma das figuras mais importantes, já que para além dos objetos ali expostos houve uma figura central, que por meio de seus gostos e vivências particulares interessou-se por esses objetos e os trouxe para si, e hoje nos deixa de herança a possibilidade de vislumbra-los ali, bem no coração de nossa cidade, localizada no fim do Hemisfério Sul.

O quarto de dormir apresenta detalhes particulares, para além das fotografias que são expostas em outros ambientes da casa. A imaginação cria asas, e nos possibilita imaginar como deveria ser “viver na arte”, a realidade de Eva parece um conto de fadas, onde ela criou um mundo para si, e ali se refugiou. De seu portão para dentro ela provavelmente se sentia aconchegada, estando a poucos metros do mundo inteiro, tornando sua habitação um espaço aproximado do conceito de não lugar. Geograficamente localizada na cidade do Rio de Janeiro, porém os cômodos a sua volta respiravam humanidade. Todo um processo histórico testemunhado por meio dos objetos, a cultura material expressando e revelando aquilo que temos de mais valioso, nossa história enquanto humanos.
Neste quarto por décadas Eva pensou em que itens adquirir, quais leilões participar. Ela certamente chorou em seu travesseiro, e também sorriu antes de adormecer. Nesse quarto ela sonhava e viajava por outros mundos.  Essa figura humana e sensível se revela mais intensamente ali, no Quarto de Dormir. Suas preocupações e felicidades foram pensados e repensados naquele espaço. Embora o foco da visita seja o acervo, as impressões em torno da figura de Eva são muitas.
Uma casa museu revela algo além do colecionismo, é uma visita pessoal, já que ao mesmo tempo em que entramos em um museu entramos em uma casa, e dessa vez sem pedir licença. Sua dona partiu, mas nos abriu sua vida, suas aspirações e conquistas.
Deitada em sua imponente cama barroca Klabin encarava a obra de Giovanni Francesco Romanelli, um importante pintor do seiscento italiano que morreu em 1662. A cena retratada é a mais infantil e inocente possível, onde cinco crianças pescam no refugio do sossego infantil, onde o mundo se reduz a uma cena lúdica e sem preocupações. Essa obra foi escolhida para seu ambiente mais pessoal, onde passaria uma grande parte do tempo em que estaria em casa. Foi a obra que arrisco afirmar que mais foi percorrida pelos olhos da eximia colecionadora.
Isso talvez revele um pouco mais da personalidade daquela figura que tanto nos interessou e que venho tentando ressaltar desde o inicio do texto. Buscando não cair em psicologismos baratos, gosto da idéia de imaginar Eva como uma dessas crianças, que inocentemente dedicava sua vida a uma missão que muitos deveriam julgar inútil, tão lúdica como a cena apresentada em seu quarto.
E como uma criança que coleciona e se apega aos seus objetos Eva se dedicou a essa missão, colecionar história, juntar pedaços de vidas, narrativas, emoções. Não só essas mais muitas outras hipóteses podem ser formuladas por uma visita a FEK. O que nos importa é que o “hobby” que para muitos era uma infantilidade se revelou com o tempo uma das mais maduras tarefas, por meio dessa sua peculiariedade Eva consegui marcar seu nome na história da cidade do Rio de Janeiro, como uma das figuras marcantes que fizeram parte da história dessa cidade.
Aconselho a todos uma visita a Fundação Eva Klabin,  e aconselho a todos que no meio desta viagem não percam a mão que ajudou a tecer todo esse emaranhado de retalhos. Uma das artistas presente ali concebeu a maior obra de todas, e é nela que você está imerso ao entrar no número 2480 da Av. Epitácio Pessoa.
Links Úteis:

http://www.evaklabin.org.br/